Internet tá meio capenga, mas não deu pra resistir ao bafão.
Eu nunca gostei do programa da Xuxa. Na verdade, eu detestava. Achava tudo retardado e tinha raiva da cara da Xuxa. Ela não foi minha rainha, e olha que até hoje eu sou baixinha.
Mas, se quando eu era criança, a Xuxa era só rainha dos baixinhos, hoje ela sagrou-se rainha do Brasil. E fez questão de arranjar também uma princesa.
Eu tenho um pouco de pena da Sasha. Ser filha de uma mulher solteira iludida com a fama, que vive num mundo de fantasia e ignora que já chegou aos 50 anos, não deve ser fácil. Depois de virar rainha, Xuxa involuiu, se é que um dia foi adulta. Voltou à infância, com todas as suas características negativas: egocentrismo, intolerância, imaturidade. Xuxa parece se considerar o centro do mundo, alguém muito importante, acima de nós. Ela é a apresentadora, e nós, como telespectadores, devemos assisti-la e admirá-la, aplaudindo e torcendo quando formos chamados a isso.
Ironicamente, foi o mundo virtual que fez com que Xuxa batesse de frente com o mundo real. Fora da televisão e das revistas de celebridades, ela é gente como a gente, mas até hoje não percebera. Até que um dia teve a idéia de criar sua conta no Twitter, espaço apertadinho, que só permite posts de até 140 caracteres. Muito pouco para comportar a megalomania dos usuários. No Twitter ninguém é maior, todos são iguais. Estão no mesmo nível.
A Xuxa não sabia disso. Desconfio que, se soubesse, não teria entrado no Twitter. Chegou gritando, escrevendo tudo em Caps Lock, e é claro que recebeu críticas e recomendações: na internet, escrever em caixa alta é gritar. Todo mundo sabe. Imagino que ela também soubesse. Talvez sua intenção fosse mesmo gritar, fazer sua voz soar mais alto e mais importante, como no mundo da fama. Num post, ela se explicou dizendo que escrevia em Caps Lock porque era "o seu jeitinho", para pouco tempo depois dar o braço a torcer e digitar como todo mundo, seguindo as regras de etiqueta da internet. Primeiro tapa na cara.
O segundo foi graças ao já famigerado erro de português da princesa Sasha, que escreveu "sena" em lugar de "cena" no Twitter da mãe. Choveram comentários, Xuxa ficou irada e postou: "pra quem não sabe minha filha foi alfabetizada em inglês..." Mais tarde: "fui vcs não merecem falar comigo nem com meu anjo".
Coitadinhos de nós. Somos indignos de nossa rainha e de nossa princesa. Não, não foi assim que reagimos. Rimos mais ainda da cara dela. Segundo tapa na cara.
Podemos até pensar: que maldade a nossa, não? Criticar uma criança de 11 anos por ter escrito uma palavra errada e uma senhora de 50 anos por ignorar a etiqueta do internetês. Mas não. A culpa não é nossa. Não fizemos isso por maldade pura. Foi por vingança.
Vingança porque nós, os telespectadores, não temos escolas decentes, não temos dinheiro, não moramos na "casa rosa", não colecionamos carros, não passamos o feriado na Disney, não somos bonitos e não aparecemos na televisão para falar com o nosso povo. Moramos no Brasil, somos uns fodidos, temos uma vida difícil, estudamos muito pra conseguir empregos semi-decentes que paguem um salário semi-decente. A Xuxa também mora no Brasil, mas é rica, adorada e estúpida. Ela pode se dar ao luxo de ser estúpida e ainda assim amada e bem-sucedida.
Mas nós não gostamos disso. Nem um pouco. Como podemos engolir que Sasha freqüente uma escola cuja mensalidade é de cinco mil reais e cometa um erro crasso de ortografia assim, impune? Se fosse conosco, não seríamos perdoados. Perderíamos a vaga. Seríamos mandados de volta às apostilas.
Xuxa e Sasha são os símbolos de uma sociedade desigual, hipócrita, cruel, estúpida e mesquinha. Até hoje, não havíamos tido oportunidade de exercer uma pequena vingança catártica contra elas. Pequena, perto da humilhação a que elas nos submetem.
Agora, graças à democracia virtual, tiramos a rainha do pedestal.
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